R$ 38,00
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Título:
HELIOTRÓPICO Autor:
Gilberto Caldat
ISBN 978-65-88865-60-6
Dimensões: 14 x 21 cm Páginas: 100 Gênero: Poesia
Publicação: Class, 2021
O livro que a leitora ou o
leitor tem em suas mãos quiçá lhe pareça familiar. Ao
folheá-lo, pensará reconhecer nele vozes familiares, de
Borges a Platão, de Calvino a Baudelaire. Se permanecer
nesta falsa impressão, terá fracassado em sua tarefa
principal, que é de abrir-se para cada livro e deixar que
lhe fale com sua voz absolutamente única. Atrás das alusões,
nem sempre tão veladas, e das evidentes referências
literárias e culturais, encontra-se uma mensagem insólita e
original. Os temas são os que são eternos em toda criação
literária (o tempo, o mundo, a morte, o que significa ser
humano...). Mas, a uma segunda, mais atenta leitura,
produzem em quem lê uma leve inquietação e certo
estranhamento, como se ouvisse uma voz conhecida e não
conseguisse reconhecê-la, como se enxergasse um rosto
familiar e o encontrasse diverso. Ao “ah, isso eu
(re)conheço” segue-se um incerto “talvez eu me engane”, que
é o prelúdio da definitiva abertura necessária para entender
(ou quiçá intuir, imaginar) o que Gilberto Caldat quer
(quer?) nos (nos?) dizer (dizer?).
É um convite a uma viagem que se desenvolve em muitos níveis
e que permite a quem lê demorar nos lugares que mais lhe
agradem, ou até perder-se numa página, numa sentença, da
qual já não conseguirá libertar-se enquanto continue lendo.
Viagem sem início e sem fim, pois há inúmeros inícios e
inúmeros fins; viagem que se estende no espaço e no tempo,
mas também se dá num lugar que se situa além de ou é
anterior a espaço e tempo. Viagem na condição humana a
partir de um momento e de um lugar nos quais ainda não
existe o humano, mas se adivinham somente os germes daquilo
que se tornará o humano – e com o termo não estou me
referindo tão somente ao ser humano, mas a tudo aquilo que o
rodeia e constitui o contexto no qual existe, sua
existência, seu universo. Deuses e diabos povoam este mundo
pré-humano, no qual os milênios são medidos por um
humaníssimo relógio, ainda que muito especial, e no qual
“coisas” como o riso, o amor, a morte e o perdão são o
resultado de um jogo de dados.
O que encontramos nestas páginas é a linguagem dos mitos e
dos sonhos, anelando realizar a tarefa talvez impossível de
revelar coisas arcaicas e misteriosas, que se deram antes
que existissem o ser humano e a própria linguagem; coisas
das quais ninguém foi testemunha senão o próprio poeta, que
reclama para si o papel de representante e porta-voz do
gênero inteiro, numa tentativa hercúlea e sisífea de contar
experiências que foram feitas antes que um sujeito possível
pudesse tê-las. Rememorando o que houve antes da memória,
descrevendo o indescritível, o autor leva os leitores para a
dimensão do eterno presente e do em-parte-alguma que
caracteriza todo poema mitológico. Sempre, contudo, o mito,
ao falar de outro tempo e lugar, fala de nós aqui e agora
para nós aqui e agora.
São mundos possíveis, habitados por outros seres – os seres
que poderíamos ter sido em outra história, em outro
universo, em outra criação. São vidas marcadas pelo amor,
pela morte, pelo riso, pela tristeza. Mas nas realidades nas
quais tais vidas são vividas e que são tão diferentes da
nossa, mesmo quando nelas encontramos nomes conhecidos,
estas palavras possuem outro sentido e indicam coisas que só
podemos vagamente imaginar, fugazmente intuir, nunca, porém,
plenamente compreender. É por isso que a linguagem do autor
se faz, inevitavelmente, alusiva e mis9
teriosa. Evoca e não reproduz. Esboça e não descreve. O
sentido do que é dito está nas entrelinhas, naquilo que não
é e não pode ser dito. Está no tom da narração, não em seu
conteúdo. Está na nostalgia pelas possibilidades que
poderiam ter sido e não foram, pelos universos semelhantes,
quase iguais ao nosso e que, contudo, não são o nosso, pelas
pessoas que nós poderíamos nos ter tornado e que não fomos,
não somos e não seremos. As possibilidades que nos são
preclusas para sempre são reveladoras, pois nos falam
daquilo que somos e de quem somos, numa definição em
negativo – poesia em modus tollens, caleidoscópio de imagens
que giram incessantemente recompondo-se em sempre novas
constelações, em sempre novas composições ad infinitum...
Só a poesia pode dar vida a tudo isso, e Gilberto Caldat é
poeta ainda que escreva em prosa. Ora, sabe-se bem que cada
poeta é um demiurgo; mas, neste caso, a atividade demiúrgica
se tornou literal, criando incessantemente sempre novos
mundos, pelos quais o autor nos conduz, incansável e
paciente, como Virgílio com Dante (outra voz que ressoa
indistinta em nosso ouvido durante a leitura), indicando-nos
o que nos parece tão estranho e tão alheio e ensinando-nos,
ao mesmo tempo, a ver nele um espelho no qual enxergamos
nosso semblante. E cada vez nos assustamos.
Alessandro Pinzani
Sobre o autor:
Gilberto Caldat nasceu e foi criado na pequena cidade de
Laranjeiras do Sul, no interior do Paraná. Mudou-se aos 17
anos para a cidade de Florianópolis, onde estudou Filosofia
na Universidade Federal de Santa Catarina e onde começou
também a trilhar o caminho das letras a partir da composição
de algumas canções que sugeriam ao mesmo tempo solidão e
parceria. Depois de 8 anos, voltou ao Paraná, para residir
em Curitiba, onde se dedicou com maior atenção aos escritos
literários e, enfim, lançou seu primeiro livro intitulado
"Os amores móveis", pela editora Multifoco, no começo do ano
de 2017. Hoje, ainda morando em Curitiba, volta aos estudos
na área de Filosofia, sendo aluno de doutorado da
Universidade Federal do Paraná, com um projeto de tese que
se agarra também ao mesma tema do seu segundo trabalho
literário: as viagens e seus múltiplos sentidos!
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