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Título:
MAIS
CAUSOS DO BRASIL PROFUNDO Autora: Zara Gerhardt
FINALISTA
DO PRÊMIO AGES
Formato: 14 x 21 cm.
Páginas: 142 Gênero: Crônicas Publicação: Class, 2022
ISBN 978-65-84571-43-3
UMA VELHA IDEIA
Luís Augusto Fischer
Em 2022, terá talvez aspecto de fantasia uma ideia que, no
entanto, percorre as histórias que a Zara está contando,
neste segundo volume de suas memórias. A ideia se chama
Brasil.
Estudante de Geologia e depois profissional da área, a Zara
não apenas leva em conta essa ideia, com ar de coisa
fenecida e coberta de teias de aranha, mas faz mais: ela
opera com a ideia chamada Brasil. Uma ideia que foi (e
tomara que volte a ser) um horizonte concreto: construir o
Brasil, explorar as entranhas do Brasil, conhecer o Brasil,
aliás, conhecer os vários Brasis que compõem nosso país.
Creio que essa é uma ideia-força por trás das histórias aqui
contadas. Cada uma delas repassa um fragmento de uma
experiência real, vivida, suada, uma experiência que se
impôs na hora em que aconteceu, décadas atrás, e que agora
volta a pedir passagem, desde aquele fundo escuro que abriga
o passado até o presente da página impressa, este palco
singular em que um indivíduo encontra outro, em reunião
singular e insubstituível.
Tudo isso, todas essas dimensões são levadas em conta pela
Zara, que neste segundo volume se mostra ainda mais madura
como pensadora e mais harmoniosa como escritora. Porque ela
aprendeu, e aqui nos mostra, que os fatos em si pouco
significam – que tristes são as coisas consideradas sem
ênfase, ensina o belo poema de Drummond –, e que o que
realmente transforma os fiapos de lembrança em textos
significativos é a percepção dos contextos, das vidas
envolvidas, do que se perde e se ganha a cada ato.
Esse conjunto de coisas se chama Brasil – como poderia se
chamar Portugal, ou Congo, ou Belarus, claro, porque a vida
se dá a ver em qualquer parte. Não se trata de achar que o
Brasil é especial, eleito por algum deus. Mas é só num lugar
específico que a vida acontece – ela se recusa a viver no
plano abstrato, das ideias gerais.
Dizia sabiamente o Borges (o Jorge Luis, não o de Medeiros;
o portenho, não o sul-riograndense) que a arte não é
platônica, porque ela não vive de ideias gerais e abstratas,
mas pelo contrário, ela só existe encarnada em um momento e
em uma vida concreta.
Assim também os valorosos relatos de memória, como estes que
a Zara oferece, todos eles e cada um deles mergulhados numa
vivência ocorrida de fato, num lugar chamado de Brasil e
sonhado com esse nome, tudo agora transformado em beleza
disponível para os bons leitores, que, como ensina
silenciosamente a Zara, ainda deveriam levar em conta a
ideia chamada Brasil. |