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Título:
a memória
é uma espécie de cravo
ferrando a estranheza
das coisas

Autor: Lau Siqueira

Edição: Casa Verde
Dimensões: 14 x 21 cm
Páginas: 88
Gênero: Poesia
Ano: 2017

A POESIA DAS INUTILIDADES NECESSÁRIAS

A memória é uma espécie de cravo ferrando a estranheza das coisas, de Lau Siqueira, marca o leitor pela quebra de expectativas provocada por seus poemas. Profícuos em imagens que trocam os móveis da casa de lugar sem aviso, os textos do autor gaúcho subvertem um modo de pensar linear, cumprindo o papel máximo da poesia. Com uma poética musical e inventiva que ousa na variação da forma, o poeta articula o não dito e o dito em versos nos quais o espaço em branco complementa o que as palavras sussurram/falam/gritam.

A obra é constituída de duas partes e, inicialmente, apresenta poemas em que prevalece a liberdade da forma em consonância com a abertura suscitada pelo conteúdo. Depois, com tercetos, propõe uma forma exata para apresentar uma visão de mundo voltada ao agora e sua poeticidade, convidando-nos à celebração do "acaso e suas delícias".

Essencialmente, os poemas versam sobre a passagem do tempo, a incompletude humana e as contradições da vida contemporânea, como muito bem sinalizam as palavras da dedicatória em que o autor afirma que "mais um livro de poemas, neste momento, significa investir na perenidade das incertezas". Nesse sentido, a leitura de Lau Siqueira nos coloca diante da única certeza que podemos ter, que é a da impermanência que nos constitui. Ao modo tão apreciado por Manoel de Barros, sua poesia nos ajuda a olhar para as insignificâncias ou, como diz o próprio poeta, para as "inutilidades necessárias".

Contemplando temas como a memória, a cidade, o amor e o corpo, Lau Siqueira edifica uma poesia de caráter filosófico e também sensorial. Seus poemas são corpos que ora instauram o devaneio que se traduz em saber, ora incitam sensações que reafirmam a natureza erótica da linguagem. Ao mesmo tempo em que provoca um pensar atemporal sobre nosso estar no mundo, sua escrita utiliza elementos da modernidade para refletir sobre as relações sociais, nas quais o sujeito perde suas referências e sua ligação primordial com a natureza.

Por todos os aspectos apontados e, principalmente, por se tratar de uma visão sensível e necessária do fluir da corrente que é o tempo e a própria vida, vale muito a pena ler A memória é uma espécie de cravo ferrando a estranheza das coisas.

Cinara Ferreira
Professora de Teoria Literária
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul